quarta-feira, dezembro 30, 2009

O Estádio


A batida da música marca o meu passo de corrida. Corro e a cada passo que dou é como se me tirassem um peso de cima dos ombros, é como se deixasse todos os meus problemas em cada impacto dos meus pés no cimento. Os músculos respondem aos impulsos nervosos e não desistem, insistem, continuam até ao limite. Oito voltas, oito problemas a esbater? Será?

As ultimas réstias de sol iluminam a pista; já a sei de cor, posso correr de olhos fechados sem perder o rumo, ficar cega por momentos, render-me a todos os outros sentidos: saborear o ar frio de Dezembro, cheirar o vento suave, sentir a velocidade nas palmas das mãos. Abro os olhos. Estou só,gosto de correr assim, sozinha, e no entanto, nunca o estou, a música está comigo, estará sempre, é uma constante da minha vida, já não me imagino sem ela.

Crepúsculo, a melhor hora do dia para se correr: no verão não está nem muito frio, nem muito calor, no inverno...bem no inverno está sempre frio mas o dia aproveita-se para outras coisas. O sol está-se a pôr, os ultimos raios de luz embatem contra os placares de plástico das bancadas; surgem reflexos, surgem as primeiras estrelas, as mais brilhantes, com certeza.

Há algumas nuvens, restos da chuva que caíu no dia anterior. A relva ainda está fresca, húmida, mas não me interessa, apenas quero deitar-me ao comprido depois de uma corrida cansativa, mas produtiva. Pórem, antes vou andar, recuperar do esforço de forma suave. Caminho em direcção ao centro do campo de futebol: uma pequena mancha branca no meio de uma imensidão de verde relva falsa. Sigo a linha de meio campo, como se fosse um equilibrista. É como se ambos os lados dessa linha fossem opostos, conceitos diferentes. Não quero cair para nenhum deles, gosto do equilibrio, do bem e do mal, do belo e do feio, deus e o diabo. A minha vida rege-se por este simples propósito: achar o intermédio, o equilibrio entre tudo. Quem diria que uma linha de meio campo daria origem a tais pensamentos?

Chego ao centro, o centro de tudo, onde se dá o inicio de tudo. Onde acaba, isso ninguém sabe. Por mim, desde que acabe bem, é-me indiferente. Mas o bem é tão relativo! Olho à minha volta, vejo se estou a ser observada, sempre tive este complexo, sinto-me segura aqui, sento-me e deixo-me relaxar. Estou no meio do circulo. No meio de tudo, sou o centro daquilo que se passa à minha volta, por isso levanto-me, olho novamente à volta, e vou em direcção às bancadas;Nem tudo pode girar à nossa volta, e nisso tenho um certo conflito interior: sei que é errado, mas gosto de ser o centro, e luto contra isso. Nas bancadas toca o telemovel: uma mensagem nova, provavelmente a desejar um feliz Natal. Não vou lê-la agora, afinal de contas, não vou responder.

Deito-me com as costas na relva, sinto a frescura da mesma nas minhas costas quentes e sabe-me bem estar ali. É um dos meus sítios favoritos, o estádio. Aqui deixo os meus problemas no asfalto onde corri, relaxo, penso, medito, olho para as estrelas que já decoram o céu. Aqui sinto-me bem, sozinha, distancio-me do mundo, dos outros, tiro um tempo para pensar em mim.

Faço o que gosto: corro. Olho para as poucas nuvens que ainda restam no céu; está a ficar tarde, levanto-me, visto o casaco. O mp3 continua a tocar, não parou desde que cheguei. E só para quando chegar a casa. Ah, se ele pudesse falar....

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